Guerra dos canudos

Cocos na orla do Rio de Janeiro (Foto: Ruy Castro / Arquivo pessoal)


Por Ruy Castro*

No começo do ano, ao dar meu expediente matinal em certo quiosque de Ipanema, calculei que, a uma média de 300 cocos servidos diariamente em cada um dos 300 quiosques da orla atlântica do Rio, estávamos contribuindo com 90 mil cocos por dia para o prazer da humanidade. Supondo que tal média se mantivesse pelo resto do ano — e esse verão, pelo visto, tende a se eternizar —, seriam 32.850.000 cocos por ano. Tudo bem. Mas seriam também 32.850.000 inúteis, degradantes e assassinos canudos de plástico. Tudo mal.

Chamar os canudos de “descartáveis” é uma ironia contra nós mesmos. Nós os descartamos — ao acabar de usá-los, costumamos deixá-los no próprio coco ou os largamos com displicência sobre a mesa ou no chão. Mas a natureza levará séculos para se livrar deles, no que terão tempo de sobra para contaminar rios e mares e ameaçar espécies marinhas ou fluviais. Para a natureza, eles não são “descartáveis”.

Os norte-americanos, que despejam 500 milhões de canudos por dia no ambiente, começam a se perguntar quem lucra com isso, exceto seus fabricantes, que impuseram aos garçons e empregados de bares e lanchonetes a cultura de enfiar — sem perguntar — um canudo em qualquer milk-shake ou lata de refrigerante servido em suas mesas. Curiosamente, em suas próprias casas, as pessoas usam copos — por sinal, de vidro —, e não canudos, para consumir suas beberagens.

Em alguns países, já há campanhas em andamento para abolir o canudo. Basta, na verdade, conscientizar os usuários a recusá-los, para levar os proprietários de bares e garçons a deixar de oferecê-los.

E, claro, sempre poderemos sair com nossos próprios canudos não descartáveis, feitos de algum material resistente, aptos a ser lavados e reusados. A natureza agradecerá.


*Ruy Castro é um dos maiores biógrafos brasileiros: já escreveu sobre Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues

Fonte: Folha de S. Paulo 

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