Governo muda a Constituição Federal para legalizar maus-tratos aos animais

    Imagem: Crueldade Nunca Mais


Por Paulo Furstenau*


O senhor da foto acima sancionou ontem, 29 de novembro de 2016, a Lei 13.364 (originada pelo PLC 24/2016), que "eleva o rodeio, a vaquejada, bem como as respectivas expressões artístico-culturais, à condição de manifestação cultural nacional e de patrimônio cultural imaterial". (Cabe lembrar aqui que rodeio nem mesmo é uma "manifestação cultural nacional", mas sim norte-americana.)

Hoje, 30 de novembro de 2016, foi a vez de a PEC 50/2016 ("PEC da vaquejada"), que "altera a Constituição Federal para estabelecer que não se consideram cruéis as manifestações culturais definidas na Constituição e registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, desde que regulamentadas em lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos", ser aprovada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).


Sanção presidencial do PLC 24/2016


Senadores e presidente passaram por cima, portanto:

1. Do Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu que vaquejadas são maus-tratos aos animais, e não esporte, em uma votação referente à regulamentação da vaquejada no Ceará, o que supostamente abriria precedente para o mesmo acontecer em outros estados brasileiros, estendendo-se também aos rodeios;

2. Dos Ministérios Públicos do Ceará e de Rondônia, que se colocaram contra a vaquejada;

3. Do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), órgão do Ministério da Cultura que seria o único a ter poder de atribuir valor de patrimônio cultural a rodeios e vaquejadas, e que não o fez;

4. Da Associação Brasileira de Medicina Veterinária Legal (ABMVL) e do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), que atestaram os maus-tratos sofridos pelos animais durante a vaquejada;


5. Da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), que em seu Artigo 32 define pena para quem "praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos";

6. Da vontade da maioria da população (não vivemos em uma democracia?), que se posicionou, na consulta pública no site do Senado, contra o PLC 24 (51.490 votos contra / 17.845 votos a favor) e contra a PEC 50 (62.134 votos contra / 17.563 votos a favor);
 



"Cidadania"? A vontade da maioria da população é totalmente ignorada


...e, o mais grave de tudo...

7. Da própria Constituição Federal Brasileira, que em seu Artigo 225, parágrafo 1º, inciso VII, afirma:


"Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.


VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.

E o que é ainda mais grave: o Artigo 225 é cláusula pétrea, que, teoricamente, não pode ser modificada. Mas o que são a Constituição Federal, o STF, órgãos oficiais de veterinária e, principalmente, a vontade do povo, perto do que realmente importa na vida para essas pessoas: o dinheiro? Este, como sempre, falou mais alto - ou alguém tem alguma dúvida de que esses políticos foram comprados pelos "empresários" organizadores de rodeios e vaquejadas? - e os brasileiros sofrem mais esse acinte. 

E os animais perdem a única "defesa" oficial que tinham - com essas aprovações, brechas podem ser encontradas para legalizar inclusive práticas já proibidas, como rinhas (de galos, cachorros e canários), além de fortalecer aquelas ainda permitidas, mas que nós, da causa animal, vínhamos combatendo há tempos, como o rodeio e vaquejada, além de testes e vivissecção. Com essas aprovações, tudo pode vir a acontecer com os animais, dentro da lei.

No último domingo, 27 de novembro, manifestantes de 38 cidades brasileiras foram às ruas para dar voz aos animais, dentro do movimento Crueldade Nunca Mais. No próximo domingo, 4 de dezembro, haverá manifestações "Fora, Temer", em que defensores dos animais proclamarão o presidente golpista (em todos os sentidos, agora contra os animais também) como inimigo dos animais - a #TemerInimigoDosAnimais já está sendo usada nas redes sociais.

Manifestação Crueldade Nunca Mais no último domingo, na cidade de São Paulo. 
"Não é esporte, é crueldade, é uma vergonha para a sociedade", 
"Não é cultura, é por dinheiro, é a vergonha de um país inteiro" 
foram algumas das frases ouvidas Brasil afora (Foto: Divulgação)


Agora, a PEC 50/2016 segue para dois turnos de discussão e votação no plenário do Senado. A ONG Veddas, junto com mais de 20 organizações da causa animal de todo o País (inclusive a Natureza em Forma), enviou para Brasília, na semana passada, uma ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) contra a PEC 50 e uma ADI (ação direta de inconstitucionalidade) contra o PLC 24. Na próxima semana, deverá haver uma audiência a respeito com o assessor do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

É a última esperança para os animais.

Seja como for, o que já podemos fazer é boicotar empresas que patrocinam rodeios e vaquejadas. Segue lista com as que estão envolvidas com a Festa do Peão de Barretos de 2017.

Patrocinadores:

Brahma
Guaraná Antarctica
Savegnago
Sky (TV por assinatura)
Fusion (bebida energética)
Trade One Bebidas
Cennarion
New Holland

Apoiadores:

Natural One (sucos "naturais")
Polo Wear
Açúcar Caravelas
Associação de Gestão Cultural no Interior Paulista
Mack Color (etiquetas e rótulos adesivos)
Farma Conde
Radade
Unimed
Unifeb - Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos
Editora Três
Revista IstoÉ
Rede Graal (restaurantes e conveniências)
Levity / Bebidas Poty
Rede Globo
EPTV
Castelo Plaza
Band FM


                     Foto: Reprodução


Não é esporte nem cultura

Além de cultura, outra denominação dada por aqueles que lucram ou são sádicos a ponto de se divertirem com essa prática bárbara contra os animais é "esporte". Acontece que a prática esportiva pressupõe oponentes em iguais condições físicas se enfrentando por sua própria vontade, o que definitivamente não é o caso. 

Bovinos são animais pacíficos, que só agem daquela forma nos rodeios, aos pulos, porque levam choques, esporadas, espetadas, entre outras violências. Quanto às vaquejadas, a crueldade é explícita: um animal correndo desesperado de dois homens montados em cavalos e tendo seu rabo puxado - e até arrancado - e sendo atirado ao chão.

Professora aposentada da faculdade de medicina veterinária da Universidade de São Paulo (USP), Irvênia Prada foi uma das autoras do parecer técnico a respeito das provas de vaquejada que foi usado pela Procuradoria-Geral da República na ação que pediu a inconstitucionalidade de uma lei do Ceará que regulamentava a prática. Segundo ela, não é possível a realização de uma vaquejada sem sofrimento dos animais, como alegam os algozes desses bichos ao se defenderem e citarem supostos cuidados empregados atualmente.

"Os próprios defensores da vaquejada admitem a vivência de sofrimento nos animais, ao argumentarem que a regulamentação do evento possa 'minimizar' os riscos dos animais. Apetrechos como protetor de cauda, luvas e colchões são recursos utilizados mais para aliviar a consciência dos praticantes – ou para 'venderem' a imagem de que são cuidadosos – do que de fato para suprimir o sofrimento dos animais", alertou Irvênia em entrevista dada à Folha de S. Paulo.

Não é esporte nem cultura. Vaquejada e rodeio são tortura.



*Paulo Furstenau é jornalista voluntário da Associação Natureza em Forma

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